sexta-feira, agosto 15, 2008

O Orkut utilizado para o cometimento de ações criminosas

O Orkut utilizado para o cometimento de ações criminosas

Neste semana três situações bastante peculiares chamaram atenção por envolverem o Orkut sendo utilizado como meio de cometimento de ações danosas.

A tecnologia, por si só, não é boa nem má: é axiologicamente neutra. Seu aspecto negativo ou positivo é dado pela intenção do usuário; é assim com todas as ferramentas tecnológicas, não sendo diferente com o Orkut.

É sabido que várias ações danosas são diariamente praticadas através do Orkut, entre outras, a criação de perfis falsos, o envio de mensagens e a criação de comunicades ofensivas algumas delas tipificando inclusive alguns dos crimes contra a honra. Também já se viu a ocorrência de crimes de difusão de pornografia infantil, apologia a crime ou criminoso, incitação ao crime, instigação ao suicídio e até tráfico de drogas através da utilização de redes sociais.

A primeira situação ocorreu em Curitiba, onde um homem foi preso por aplicar golpes pela Internet. Conforme notícia da Folha On Line, ele utilizava-se do Orkut para aproximar-se das vítimas tendo aplicado golpes no valor de mais de R$ 80.000,00 em duas médicas da cidade. O cidadão já responde a processos pelo crime de estelionato.

A segunda situação ocorreu em São Paulo, segundo o site da Info Online, onde uma falsa ameaça de bomba foi propagada através desta rede social. Um prédio foi esvaziado em função da comunicação. Segundo a notícia um inquérito foi iniciado para apurar responsabilidades. Possivelmente há a tipificação do crime de comunicação falsa de crime ou contravenção ou, dependendo das circunstâncias a tipificação do crime de ameaça.

O terceiro e último caso, ocorreu em Santa Catarina, conforme informação do site Consultor Jurídico. Um advogado, criou perfis falsos de duas pessoas. Em tais perfis realizou ele uma montagem com fotos pornográficas envolvendo uma das vítimas e no outro atribuiu preferências homossexuais a outro, namorado da primeira vítima. Após investigação policial o autor dos perfis falsos foi preso em flagrante em uma lan house, acusado do crime de falsidade ideológica.

Este último caso merece uma atenção mais aprofundada sobre da tipificação legal destes crimes. Vejamos como está descrito, em nosso Código Penal, o crime de falsidade ideológica. Assim reza o art. 299:

Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular.

Certamente um perfil do Orkut não pode ser considerado como um "documento público ou particular". Embora parecer-nos certa a existência de um grave dano moral às vítimas, devemos notar que não podemos utilizar a analogia para tentar efetuar condenações, como nos ensina o princípio da proibição da analogia "in malan parte". Em sendo assim, a analogia não poderia ser utilizada aqui para abranger como documento particular uma página na internet. O conceito de documento está ligado ao seu suporte fático, não podendo abranger documentos eletrônicos. Ademais para a configuração do crime de falsidade ideológica, deve ter o autor a incumbência de preencher o documento e preenche-o com declaração falsa. Certamente, nesta situação, não tinha o autor a incumbência de criar perfis no orkut para os ofendidos. Ainda a expressão "fato jurídico relevante", deve ser considerada nesta situação. Ao manifestar-se sobre esse crime diz E. Magalhães Noronha, em Direito Penal, v. IV, p. 161: "é mister que a declaração falsa constitua elemento substancial do ato de documento. Uma simples mentira, mera irregularidade, simples preterição de formalidade, etc., não constituirão." Luiz Regis Prado, nos seus comentários ao Código Penal, nos ensina: "A falsidade feita com exclusivo animus jocandi, ou sem qualquer interesse jurídico, não configura o delito. Não é a mera mentira que se pune, mas a ofensa à veracidade naquilo que o ordenamento jurídico entende necessário, o que se depreende da própria exigência legal de que se trate de falsidade relativa a fato juridicamente relevante.
A conduta, mesmo sem a existência de um crime atual que a classifique, provavelmente poderia ser tipificada também como inserção de dados falsos em sistema de informatizado. Nosso código penal passou a definir crime semelhante, quando modificado pela lei 9983/2000. Porém o tipo penal aplica-se apenas a funcionários públicos quando praticarem a conduta em sistemas da administração pública. Assim reza o art. 313-A do CP.

Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano:" (AC)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa." (AC)

O substitutivo aos PLS 76/2000, PLS 137/2000 e PLC 89/2003, de autoria do senador Eduardo Azeredo, caso transformado em lei, abrangeria essa conduta como criminosa. O projeto infelizmente não traz o tipificação do crime de inserir dados falsos em sistema informatizado. No entanto, poderíamos realizar a tipificação como crime de falsificação de dado eletrônico ou documento particular. O art. 16 do projeto de lei define como dados informáticos, qualquer representação de fatos, informações ou de conceitos sob forma suscetível de processamento numa rede de computadores ou dispositivo de comunicação ou sistema informatizado. É através da equiparação legal do art. 16 do projeto de dado informático como "representação de fatos" que poderia haver a tipificação. Atualmente, como não há a equiparação legal de "dado" à coisa, e também pelo crime atual de falsificação não trazer em seu bojo a falsificação de "dados" é que não poderia ser realizada a tipificação com base nesse crime.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...