terça-feira, novembro 14, 2006

A ampliação do tipo penal de divulgação de material pedófilo

Em uma semana em que o senado promete endurecer nossa legislação contra os adquirentes de pedofilia na internet, cabem algumas considerações sobre o assunto. Nossa legislação estabelece a punição pela divulgação de material pedófilo no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

"Apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente:
Pena - reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
"

O grande problema desse artigo é que não se enquadram nesse tipo penal as condutas de “acessar” e “comprar”. A conduta de comprar, estaria de certa forma abrangida pela conduta de acessar. É nessa esteira que o projeto do senador Marcelo Crivela foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Este projeto de lei visa a punição também de quem acessa além de quem transmite o material pedófilo na internet.

Como nossos tribunais ainda não se manifestaram sobre a questão do acesso, recorremos ao Direito Comparado para a análise dessa situação. Nos EUA, no estado da Pennsylvania (Anthony Diodoro vs Commonwealth of Pennsylvania), decidiu-se que o acesso ao material pedófilo sem o ato intencional de gravar as fotos acessadas não constitui crime, pelas leis americanas. Tal decisão analisada sob a égide de nossa lei também não constitui crime. O crime ocorreria (pela lei da Pennsylvania) apenas se alguém salvasse intencionalmente as mensagens e não pelo simples acesso. A referida decisão tratou a questão entendendo que :

State law says that a person must have "knowing possession" of child pornography in order for it to be a crime. A panel of three judges in the Pennsylvania Superior Court concluded that Diodoro (nome do acusado) could not be convicted of knowingly possessing the images because there was no evidence that Diodoro knew that his computer was storing the images in its internet cache file.

Ademais também discutiu-se a questão da ambiguidade da lei, no sentido de que em havendo dúvida, o réu deve ser absolvido. Algo como o princípio do “in dubio pro reo”. Isso uma vez que a lei americana considera crime apenas o “knowingly possesses” do material. A dubiedade do sentido de “knowingly possesses” é que garantiu a absolvição do réu. Cabe trazer o texto específico desse tipo penal:

Any person who knowingly possesses or controls any book, magazine, pamphlet, slide, photograph, film, videotape, computer depiction or other material depicting a child under the age of 18 years engaging in a prohibited sexual act or in the simulation of such acts commits an offense.

Isso significa que deveria haver, no caso da lei do referido estado, uma intenção prévia de salvar as imagens, não bastando que elas ficassem armazenadas nos arquivos temporários do computador para a tipificação do crime de acesso ilegal.
Torna-se importante essa discussão, uma vez que aquele tribunal entendeu que o armazenamento automático nos arquivos temporários do browser não configuraria a “intenção de armazenamento”. Isso, pois não se conseguiu provar que o acusado teria a intenção de salvar as mensagens ou que sabia que tais imagens ficariam guardadas nos arquivos temporários de seu navegador, circunstância que pesou na hora de sua absolvição.

Tais reflexões, mesmo que baseadas em casos fora da jurisdição nacional são importantes para o esclarecimento de nossos legisladores no momento em que se visa a ampliação do tipo penal de divulgação de material pedófilo. A especifidade do tipo penal deve ser muito bem observada sob pena de não abranger condutas reprováveis, como no caso da decisão americana.

A decisão integral pode ser lida em http://www.superior.court.state.pa.us/opinions/a23036_06.PDF

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