terça-feira, novembro 14, 2006

Controle da internet não coibirá crime, mas privacidade

Em face das recentes discussões sobre o projeto de lei que previa a obrigatoriedade de um cadastramento de todos que utilizassem a Internet no Brasil, venho publicar o artigo do Prof. Alexandre Atheniense.
Quero agradecer desde já a gentileza do Prof. Alexandre em permitir a publicação de seu artigo. Ao mesmo tempo, também quero divulgar e indicar o blog "O Direito e as novas Tecnologias", de sua autoria, fonte de inestimáveis contribuições para o Direito da Tecnologia da Informação. Segue o artigo.

Há cerca de sete anos, estamos aguardando a tramitação do Projeto de Lei que cria novos tipos penais para regulamentar os crimes que surgiram a partir da adoção dos sistemas informatizados.
Mais um ano está terminando e novamente a expectativa que havíamos renovado para que esta lei entrasse em vigor no ano de 2006 foi frustrada pela nova redação apresentada pelo relator, senador Eduardo Azeredo, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que teve sua tramitação mais uma vez paralisada por ter sido retirado de pauta a pedido de alguns senadores.
O motivo desta frustração foi à inclusão na undécima hora de uma série de dispositivos que visam criar um rígido, ineficiente e inconstitucional regime de controle de acesso da internet a ponto de igualar o Brasil a países totalitaristas que tentam exercer um rígido controle de censura e violação de privacidade na internet.
Se o relator mantivesse o texto original, focando apenas na criação dos novos tipos penais como inserção de vírus, acesso não autorizado a sistemas e outros além da obrigatoriedade de armazenamento pelos provedores de registros eletrônicos que auxiliam no processo investigatório, por determinado período, certamente teríamos um desfecho mais célere para que a lei entrasse em vigor.
O texto como está, prevendo a regulamentação do acesso a internet, é cartorial e sufoca a privacidade e o direito do cidadão à informação. Fica claro que há um interesse de criar um grande cartório para identificar o cidadão brasileiro para acessar a internet, com o uso da certificação digital, quem sabe, uma espécie de Internetbras, o que é péssimo para o cidadão.
O aspecto mais inadmissível do projeto, do ponto de vista da liberdade de escolha do cidadão, é o condicionamento do acesso à internet a um credenciamento prévio, obrigatório, sujeitando quem contrariar essa determinação à alguma pena.
Obrigar a pessoa que quiser acessar a internet a realizar o cadastro prévio, além de absurdo e burocrático, é inócuo, pois quem está praticando ilícitos na rede vai continuar praticando; mesmo que esse cadastramento seja obrigatório.
O internauta infrator pode buscar uma conta gratuita em um provedor no exterior e, a partir daí, fazer os mesmos ataques que já realiza hoje. Por isso, não há nenhuma garantia que qualquer cadastro será capaz de erradicar os crimes praticados pelo meio eletrônico.
Pode se dizer que existe uma hipocrisia ao imaginar que a partir do credenciamento, o problema dos ataques ou rimes cibernéticos vão ser erradicados. Nem de longe os crimes vão terminar a partir desse procedimento.
Fica patente que, por detrás do projeto, existem muitos interesses cartoriais. O que se quer é criar um grande cartório, por meio de uma regra para impor o credenciamento prévio, quem sabe sujeitar à certificação digital todos os internautas do país e depois se fazer venda de certificado eletrônico com exclusividade pelos cartórios.
Este projeto contraria o próprio espírito da internet quando foi criada, de forma livre, em estabelecer qualquer controle em grandes proporções. Se a intenção com a adoção da obrigatoriedade do credenciamento é cessar a prática do crime eletrônico no Brasil, o objetivo não será alcançado, pois o agente criminoso vai operar por meio de um provedor no exterior. Por este motivo, estas amarras por meio da legislação só servirão para sufocar a privacidade do cidadão e criar o cartório.
A se persistir o excesso de rigor sobre a identificação dos internautas, vamos ter a eliminação de diversos provedores de pequeno porte do mercado, além de dificultar a inclusão de classes menos favorecidas a internet no nosso país aumentando ainda mais o apartheid digital que já existe.

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