Recentemente um vídeo do Canal do Otario foi retirado do Youtube à pedido dos Correios. O vídeo era uma crítica do canal acerca dos serviços prestados por esta empresa. Para a retirada do vídeo do Youtube, os Correios usaram o argumento de proteção da marca, baseando-se na lei 9.279/96.
Para quem se interessa pelo assunto, segue a íntegra do agravo de instrumento.
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0026427-58.2013.4.03.0000/SP
RELATORA |
: |
Desembargadora Federal CONSUELO YOSHIDA |
AGRAVANTE |
: |
Empresa Brasileira de Correios e Telegrafos ECT |
ADVOGADO |
: |
SP135372 MAURY IZIDORO |
AGRAVADO |
: |
GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA |
ADVOGADO |
: |
SP091311 EDUARDO LUIZ BROCK |
ORIGEM |
: |
JUIZO FEDERAL DA 19 VARA SAO PAULO Sec Jud SP |
No. ORIG. |
: |
00181205120134036100 19 Vr SAO PAULO/SP |
DECISÃO
DEFIRO PARCIALMENTE o efeito suspensivo pleiteado (CPC, art. 537, III), nos termos que seguem.
A agravante interpôs o presente agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, rectius,
antecipação da tutela recursal, contra a r. decisão de fls. 27/32 dos
autos originários (fls. 48/53 destes autos) que, em sede de ação
ordinária, indeferiu o pedido de tutela antecipada, que visa compelir a
agravada a retirar imediatamente vídeo ofensivo a sua imagem
institucional junto a seus canais de veiculação, e caso assim já tenha
sido feito, fique impossibilitada de reincluí-lo, seja de forma
espelhada, fragmentada ou invertida, sob pena de multa diária de R$
100.000,00 (cem mil reais).
Pretende a
agravante a reforma da r. decisão agravada, alegando, em síntese, que,
em 01/10/2013, tomou conhecimento de veiculação de vídeo ofensivo a sua
imagem institucional, vídeo este disponibilizado a partir do dia
28/09/2013 nos sítios eletrônicos WWW.canaldootario.com.be e WWW.youtube.com.br,
no qual faz diversas alusões aos seus serviços, marcas e ao corpo do
comando; que a demanda não se controverte quanto à liberdade de
imprensa, mais sim que seu exercício deverá sofrer limitações impostas
pela lei, dentre as quais, sobreleva-se o respeito pela honra e a
responsabilidade pela divulgação de informações de caráter ofensivo ou
degradante; que pela análise do vídeo juntado aos autos, constam
diversas declarações inverídicas e ofensivas em desfavor da ECT, com
caráter exclusivamente difamatório, com o único intuito de macular a
imagem da ECT perante à sociedade; que o autor dos vídeos extrapolou a
sua liberdade de expressão ao apresentar as logomarcas da agravante de
forma perjorativa, com a alteração dos signos originais para a inclusão
de palavras passíveis de denegrir a sua imagem; que basta que o ilícito
espelhe em conduta proibida por lei, não havendo que se falar em culpa
ou dano; que a pessoa jurídica será submetida a proteção de sua honra
objetiva, pois goza de uma reputação, passível de ficar abalada por atos
que afetam o seu bom nome no mundo civil ou comercial onde atua; que os
danos causados à diminuição do conceito público, que goza a ECT,
poderão afetar além do seu bom nome no mundo civil ou comercial,
causar-lhe prejuízos de ordem patrimonial, tendo em vista que ao
denegrir a imagem da ECT poderá trazer uma perda efetiva de clientela;
que a liberdade de imprensa não é ilimitada, devendo observar a honra e
boa imagem, não se prestando como meio de denegrir ou macular a honra
alheia; que a Lei nº 9.279/96 regula direitos e obrigações relativos à
propriedade industrial, sendo que dentre eles se destaca a proteção aos
sinais registráveis como marca.
Assiste parcial razão à agravante.
Segundo
sustenta a agravante, no vídeo anexado aos presentes autos constam
diversas declarações inverídicas, ofensivas e atentatórias em seu
desfavor, com caráter difamatório, incluindo a utilização de suas marcas
nacionalmente conhecidas, com satirizações que visam apenas denegrir a
sua imagem perante a opinião pública.
Da
análise do vídeo trazido à colação pela agravante depreende-se que,
embora o mesmo possua evidente conteúdo jocoso, com linguagem de mau
gosto empregada em alguns momentos da sua exibição, seu conteúdo
demonstra a insatisfação com os serviços prestados pela agravante,
hipótese que caracteriza o mero exercício do direito de crítica, que
decorre da liberdade de pensamento garantida pelo Texto Maior.
Nesse aspecto, dispõe o art. 220 da Constituição Federal :
Art.
220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão
qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§
1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço á
plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de
comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e
XIV.
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
A respeito do tema, leciona ALEXANDRE DE MORAES (Direito Constitucional, Ed. Atlas, 16ª Ed.; 2004, p. 74) :
A
manifestação do pensamento é livre e garantida em nível constitucional,
não aludindo a censura prévia em diversões e espetáculos públicos. Os
abusos porventura ocorridos no exercício indevido da manifestação do
pensamento são passíveis de exame e apreciação pelo Poder Judiciário com
a conseqüente responsabilidade civil e penal de seus autores,
decorrentes inclusive de publicações injuriosas na imprensa, que deve
exercer vigilância e controle da matéria que divulga. Atualmente, como
ressalta Pinto Ferreira, "o Estado democrático defende o conteúdo
essencial da manifestação da liberdade que é assegurado tanto sob o
aspecto positivo, ou seja, proteção da exteriorização da opinião, como
sob o aspecto negativo, referente à proibição de censura".
Contudo, o mesmo não pode ser dito em relação ao uso da marca da agravante.
De
fato, o vídeo alvo da controvérsia possui inegável uso indevido da
marca, apresentando evidente conotação negativa dirigida contra a marca
CORREIOS, o que não é permitido diante da proteção que se deve atribuir
às marcas, que são sinais indicadores da origem e proveniência dos
produtos e serviços.
Como é sabido, a
marca tem sua proteção assegurada pela Lei nº 9.279/96, conforme se
extrai do disposto no artigo 130, ora transcrito :
Art. 130. Ao titular da marca ou ao depositante é ainda assegurado o direito de :
I - ceder seu registro ou pedido de registro;
II - licenciar seu uso;
III - zelar pela sua integridade material ou reputação.
Assim
sendo, deve a agravada promover a imediata supressão das partes do
vídeo em que são veiculadas indevidamente as logomarcas de propriedade
da agravante, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa
diária de R$ 10.000.00 (dez mil reais).
Em face do exposto, DEFIRO PARCIALMENTE
o efeito suspensivo pleiteado (CPC, art. 527, III), para determinar à
agravada que promova a imediata supressão das partes do vídeo em que são
veiculadas indevidamente as logomarcas de propriedade da agravante, no
prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária de R$
10.000.00 (dez mil reais).
Intime-se a
agravada, nos termos do art. 527, V, do CPC, para que responda, no
prazo legal, instruindo-se adequadamente o recurso.
Comunique-se ao MM. Juízo a quo, dispensando-o de prestar informações, nos termos do art. 527, IV, do mesmo Código.
Intimem-se.
São Paulo, 21 de novembro de 2013.
Consuelo Yoshida
Desembargadora Federal