sexta-feira, julho 11, 2014

Decisão que ordenou a retirada do vídeo do Canal do Otário do Youtube

Recentemente um vídeo do Canal do Otario foi retirado do Youtube à pedido dos Correios. O vídeo era uma crítica do canal acerca dos serviços prestados por esta empresa. Para a retirada do vídeo do Youtube, os Correios usaram o argumento de proteção da marca, baseando-se na lei 9.279/96.

Para quem se interessa pelo assunto, segue a íntegra do agravo de instrumento.




AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0026427-58.2013.4.03.0000/SP


2013.03.00.026427-5/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CONSUELO YOSHIDA
AGRAVANTE : Empresa Brasileira de Correios e Telegrafos ECT
ADVOGADO : SP135372 MAURY IZIDORO
AGRAVADO : GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA
ADVOGADO : SP091311 EDUARDO LUIZ BROCK
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 19 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00181205120134036100 19 Vr SAO PAULO/SP
DECISÃO
DEFIRO PARCIALMENTE o efeito suspensivo pleiteado (CPC, art. 537, III), nos termos que seguem.
A agravante interpôs o presente agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, rectius, antecipação da tutela recursal, contra a r. decisão de fls. 27/32 dos autos originários (fls. 48/53 destes autos) que, em sede de ação ordinária, indeferiu o pedido de tutela antecipada, que visa compelir a agravada a retirar imediatamente vídeo ofensivo a sua imagem institucional junto a seus canais de veiculação, e caso assim já tenha sido feito, fique impossibilitada de reincluí-lo, seja de forma espelhada, fragmentada ou invertida, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Pretende a agravante a reforma da r. decisão agravada, alegando, em síntese, que, em 01/10/2013, tomou conhecimento de veiculação de vídeo ofensivo a sua imagem institucional, vídeo este disponibilizado a partir do dia 28/09/2013 nos sítios eletrônicos WWW.canaldootario.com.be e WWW.youtube.com.br, no qual faz diversas alusões aos seus serviços, marcas e ao corpo do comando; que a demanda não se controverte quanto à liberdade de imprensa, mais sim que seu exercício deverá sofrer limitações impostas pela lei, dentre as quais, sobreleva-se o respeito pela honra e a responsabilidade pela divulgação de informações de caráter ofensivo ou degradante; que pela análise do vídeo juntado aos autos, constam diversas declarações inverídicas e ofensivas em desfavor da ECT, com caráter exclusivamente difamatório, com o único intuito de macular a imagem da ECT perante à sociedade; que o autor dos vídeos extrapolou a sua liberdade de expressão ao apresentar as logomarcas da agravante de forma perjorativa, com a alteração dos signos originais para a inclusão de palavras passíveis de denegrir a sua imagem; que basta que o ilícito espelhe em conduta proibida por lei, não havendo que se falar em culpa ou dano; que a pessoa jurídica será submetida a proteção de sua honra objetiva, pois goza de uma reputação, passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo civil ou comercial onde atua; que os danos causados à diminuição do conceito público, que goza a ECT, poderão afetar além do seu bom nome no mundo civil ou comercial, causar-lhe prejuízos de ordem patrimonial, tendo em vista que ao denegrir a imagem da ECT poderá trazer uma perda efetiva de clientela; que a liberdade de imprensa não é ilimitada, devendo observar a honra e boa imagem, não se prestando como meio de denegrir ou macular a honra alheia; que a Lei nº 9.279/96 regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, sendo que dentre eles se destaca a proteção aos sinais registráveis como marca.
Assiste parcial razão à agravante.
Segundo sustenta a agravante, no vídeo anexado aos presentes autos constam diversas declarações inverídicas, ofensivas e atentatórias em seu desfavor, com caráter difamatório, incluindo a utilização de suas marcas nacionalmente conhecidas, com satirizações que visam apenas denegrir a sua imagem perante a opinião pública.
Da análise do vídeo trazido à colação pela agravante depreende-se que, embora o mesmo possua evidente conteúdo jocoso, com linguagem de mau gosto empregada em alguns momentos da sua exibição, seu conteúdo demonstra a insatisfação com os serviços prestados pela agravante, hipótese que caracteriza o mero exercício do direito de crítica, que decorre da liberdade de pensamento garantida pelo Texto Maior.
Nesse aspecto, dispõe o art. 220 da Constituição Federal :

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço á plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

A respeito do tema, leciona ALEXANDRE DE MORAES (Direito Constitucional, Ed. Atlas, 16ª Ed.; 2004, p. 74) :

A manifestação do pensamento é livre e garantida em nível constitucional, não aludindo a censura prévia em diversões e espetáculos públicos. Os abusos porventura ocorridos no exercício indevido da manifestação do pensamento são passíveis de exame e apreciação pelo Poder Judiciário com a conseqüente responsabilidade civil e penal de seus autores, decorrentes inclusive de publicações injuriosas na imprensa, que deve exercer vigilância e controle da matéria que divulga. Atualmente, como ressalta Pinto Ferreira, "o Estado democrático defende o conteúdo essencial da manifestação da liberdade que é assegurado tanto sob o aspecto positivo, ou seja, proteção da exteriorização da opinião, como sob o aspecto negativo, referente à proibição de censura".

Contudo, o mesmo não pode ser dito em relação ao uso da marca da agravante.
De fato, o vídeo alvo da controvérsia possui inegável uso indevido da marca, apresentando evidente conotação negativa dirigida contra a marca CORREIOS, o que não é permitido diante da proteção que se deve atribuir às marcas, que são sinais indicadores da origem e proveniência dos produtos e serviços.
Como é sabido, a marca tem sua proteção assegurada pela Lei nº 9.279/96, conforme se extrai do disposto no artigo 130, ora transcrito :

Art. 130. Ao titular da marca ou ao depositante é ainda assegurado o direito de :
I - ceder seu registro ou pedido de registro;
II - licenciar seu uso;
III - zelar pela sua integridade material ou reputação.

Assim sendo, deve a agravada promover a imediata supressão das partes do vídeo em que são veiculadas indevidamente as logomarcas de propriedade da agravante, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária de R$ 10.000.00 (dez mil reais).
Em face do exposto, DEFIRO PARCIALMENTE o efeito suspensivo pleiteado (CPC, art. 527, III), para determinar à agravada que promova a imediata supressão das partes do vídeo em que são veiculadas indevidamente as logomarcas de propriedade da agravante, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária de R$ 10.000.00 (dez mil reais).
Intime-se a agravada, nos termos do art. 527, V, do CPC, para que responda, no prazo legal, instruindo-se adequadamente o recurso.
Comunique-se ao MM. Juízo a quo, dispensando-o de prestar informações, nos termos do art. 527, IV, do mesmo Código.
Intimem-se.

São Paulo, 21 de novembro de 2013.
Consuelo Yoshida
Desembargadora Federal


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