Publico aqui a íntegra da decisão que multa o Google em R$ 1.000.000,00 pela não retirada de um vídeo considerado ofensivo ao candidato Edgar Bueno na cidade de Cascavel.
O assunto é de grande repercussão tanto nas redes sociais como na imprensa. Espero, com a publicação da decisão, contribuir para a especialização do debate.
Os endereços
foram omitidos para evitar a propagação indevida dos vídeos, respeitando assim a decisão judicial.
Sentença em 22/09/2012 -
RP Nº 24304 DR. VALMIR ZAIAS COSECHEN
TRIBUNAL REGIONAL
ELEITORAL DO PARANÁ
184ª. ZONA ELEITORAL DE
CASCAVEL
Autos nº
243-04.2012.6.16.0184
REPRESENTANTE: COLIGAÇÃO
MINHA VIDA É CASCAVEL
REPRESENTADO: GOOGLE
BRASIL INTERNET LTDA,
VISTOS, etc.
Noticia a Representante
propaganda irregular pela internet nos sítios mencionados, feitos
anonimamente e com expressões ofensivas à honra do candidato à
Prefeito EDGAR BUENO: 01 vídeos divulgados no youtube, fls 12, no
seguinte endereços:
- conta com o nome de
FILHO DE UMA PUTA, no seguinte endereço:
xxxxxxxxxxxx
onde se editou um vídeo,
com seguinte endereço:
xxxxxxxxxxxx
cujo texto e áudio,
contém expressões ofensivas como “lugar de corrupto é na
cadeia”, “licitação fraudulenta e direcionada”, “pra
canalhas como Edgar Bueno...”, “Lugar de corrupto bandido e
ladrão é na cadeia.”
Liminar deferida às fls
12, para excluir a conta anônima acima referida, no prazo de 12
horas, sob pena de multa de R$5.000,00 a R$30.000,00, artigo 23 da
Resolução TSE 23.370, bem como para que preste informações sobre
os dados cadastrais do usuário da referida conta, no prazo de 05
dias.
Notificação da Google
em 14.09.2012, fls 14 e 15.
A Google protocolou
petição em 15.09.2012, com várias alegações de mérito e
informando que não deu cumprimento à ordem judicial: “(I) é
impossível a remoção do vídeo, por tratar-se de conteúdo
protegido pelos princípios da liberdade de expressão e livre
manifestação do pensamento, bem como pelo fato de que, não se
trata de propaganda eleitoral negativa, mas simples matéria
informativa; (II) não há possibilidade de efetuar o monitoramento
prévio do conteúdo; (III) é impossível o fornecimento de dados
pessoais do usuário, sendo o IP dado suficiente para identificação
do mesmo; (IV) Impossibilidade de concessão da medida liminar, pela
inexistência de requisitos – irreversibilidade da medida; (V) que
não pode fornecer IP sem ordem judicial, pois estes dados implicam
na identificação do usuário, o que significa que demandam ordem
judicial para fornecimento.”
Às fls 43 foi
determinada a realização de Ata Notarial para comprovação da
existência, permanência e conteúdo dos vídeos. Realizada e
juntada às fls 84 e 85, em 18.09.2012, do que foi dado vistas às
partes e ao Ministério Público, que reiteraram o contido nos autos.
Em r. Parecer, fls 39 a
41, a Dra Promotora de Justiça, pugna pela procedência,
confirmando-se a liminar concedida, com fixação de multa diária
pelo descumprimento da ordem judicial; pela improcedência quanto ao
pedido para que a Reclamada se abstenha de veicular vídeos que
violem ou ofendam a honra do Representante.
DECIDO
O artigo 21 da Resolução
TSE 23.370 (art. 57-D caput da Lei 9.504/97) permite a livre
manifestação do pensamento por meio da rede mundial de
computadores, vedado o anonimato.
Por outra via o artigo
13, inciso IX da referida Resolução menciona entre as propagandas
vedadas, a que “caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa...”,
fatos que podem caracterizar crime eleitoral, na forma do artigos
324, 325 e 326 do Código Eleitoral.
Assim sendo, tratando-se
de propaganda irregular, compete ao Juiz Eleitoral determinar sua
exclusão, artigo 40-B e artigo 41, §§ 1º. e 2º., da Lei
9.504/97, artigo 76, § 1º. da Resolução TSE 23.370, daí o
cabimento da medida liminar, a despeito de afirmar o contrário a
Reclamada.
Quanto a alegação da
Google de que não se trata de propaganda eleitoral negativa ou
extemporânea. Não se trata de propaganda extemporânea, realmente.
Mas trata-se de propaganda vedada, conforme supracitado, por fatos
que podem caracterizar crime eleitoral, nos termos dos artigos 324 a
326 do Código Eleitoral, portanto vedadas pela legislação
eleitoral.
Quanto a liberdade de
expressão, ela não é absoluta, como pretende a representada
Google, pois encontra limites, em especial na legislação eleitoral
supracitada, que veda o anonimato, bem como as propagandas
inverídicas, injuriosas, difamatórias e caluniosas.
Quanto a impossibilidade
da Google impedir que os usuários insiram novos vídeos no site
youtube, é fato verdadeiro, tanto que a legislação eleitoral
somente pune o mantenedor ou provedor da internet, depois que
notificado da irregularidade, não retirar a propaganda irregular, no
prazo determinado pela Justiça Eleitoral, como ocorreu no presente
caso, artigo 23 da Resolução TSE 23.370 e artigo 57-F, caput da Lei
9.504/97.
Quanto a alegação de
que “somente pode fornecer dados mediante ordem judicial”, é o
caso presente, portanto deveria ter cumprido.
Assentadas essas
premissas, demonstrando-se o equívoco nas afirmações da
representada Google, resta a análise do conteúdo dos vídeos para
verificar se contém as expressões desonrosas ao candidato da
coligação representante, que a representada afirma inexistir.
1º. Vídeo – XXXXXXX
Verificada a existência
e permanência do vídeo, em 18 de setembro de 2012, conforme ata
notarial juntada às fls 84 e 85, vídeo postado junto ao website
“Youtube”, pelo usuário registrado sob o nome de “filho de uma
puta”, em 05 de setembro de 2012, e intitulado “Edgar bueno
cadeia”, cf. Ata Notarial, fls 84, seguindo-se o texto.
Analisando o conteúdo,
consta “Áudio e texto: O grande avanço na educação de Cascavel,
foi a distribuição de 50 mil kits de uniformes escolares em dois
anos. – Texto: Licitação fraudulenta e direcionada. Nenhuma
empresa de Cascavel pode participar da licitação, pois a prefeitura
exigiu um capital social mínimo de R$232.470,00 das concorrentes.
Denuncias acusam que as camisetas foram adquiridas por 240% a mais
que em outros casos. No lote dos tênis, a diferença foi absurda se
comparado com o valor pago em Bragança Paulista-SP, na mesma época
que adquiriu o mesmo modelo de tênis por R$28,76, enquanto que em
Cascavel cada par custou R$47,00. – Áudio e vídeo: Agora, grande
novidade do Edgar é a distribuição gratuita de netbooks como este
para os alunos do 3º. (terceiro) ao 5º. (quinto) ano e para todos
os professores. – Texto: O que faltou dizer foi que a entrega
desses equipamentos foi suspensa pela Justiça sob acusação de
falta de planejamento na execução do programa. – Texto: Prefeito
Edgar Bueno 12. Se você conhece, desconfie! Pra canalhas como Edgar
Bueno, perder qualquer eleição não basta para que a justiça seja
feita, porque lugar de corrupto, bandido e ladrão é na cadeia.
Produção Liga da Justiça. Estamos de olho” (grifo meu).
Portanto, não há
dúvidas de que o texto contém expressões injuriosas, difamatórias
e caluniosas, agravado pelo fato do autor estar escondido sob o manto
do anonimato.
Assim, quando se utiliza
de um pseudônimo, está escondendo-se atrás do anonimato,
dificultando eventual direito de resposta e responsabilização, daí
por que não é aceitável. O fato de poder identificar o anônimo,
após investigação, não lhe retira a característica de anonimato.
Em conclusão,
verifica-se que o vídeo é de conteúdo eleitoral e contém
propaganda eleitoral vedada pela Justiça Eleitoral, seja porque faz
juízo de valor sobre candidato, escondido sob o manto do anonimato,
o que é vedado, seja porque contém expressões injuriosas,
difamatórias ou caluniosas, somado ao anonimato, o que constitui
crime eleitoral, tudo conforme artigo 13, inciso IX e artigo 21 da
Resolução TSE 23.370 e artigo 57-D da Lei 9.504/97, c/c artigos
324, 325 e 326 do Código Eleitoral.
Das Penalidades
aplicáveis à GOOGLE
A Google é responsável
pelo Youtube, não realizou a retirada dos vídeos no prazo fixado
pela Justiça Eleitoral, respondendo pela infração na forma do
artigo 57-F, caput da Lei 9.504/97 e artigo 23 da Resolução TSE
23.370. Assim, considerada a reiterada renitência da mesma ao
descumprimento Judicial, considerado a gravidade do fato e o porte
empresarial da mesma, fixo-lhe a cominação máxima prevista na
legislação supracidada, qual seja, R$30.000,00.
Pena Cominatória
Responde ainda a Google
pela pena cominatória, pois tratando-se de obrigação de fazer, é
perfeitamente aplicável a pena cominatória, na forma do artigo 461,
§ 3º. do CPC, com intuito único de constranger ao cumprimento do
comando judicial.
O valor da pena
cominatória deverá ser aplicado, “considerando o grande porte da
empresa reclamada, considerando a importância e a urgência da
medida, para o equilíbrio e a lisura eleitoral, marco máximo da
Democracia Brasileira, bem como a gravidade do ato de desobediência
Judicial.”, conforme consignado nos Autos 216-21.2012.6.16.0184,
deste Juízo.
Assim, fixo à Google a
pena cominatória de R$1.000.000,00 (hum milhão de reais) por dia de
atraso no cumprimento da determinação judicial, fixando-lhe o prazo
de quarenta e oito horas para cumprimento.
Embora a Reclamada ache
exagerada a multa diária, fixada nos autos 216-21, citados, ela se
mostrou ainda assim, insuficiente para forçar o cumprimento da ordem
judicial, pois até a data de 18 de setembro de 2012, data da
lavratura da Ata Notarial, ela ainda não havia excluído os vídeos,
como aqui não fez, o que mostra que a pena pecuniária não é
exagerada, nem suficiente.
A conduta da Reclamada é
extremamente grave, pois demonstra haver uma postura uniforme e
reiterada no descumprimento das ordens Judiciais, tanto que já
existem três processos desta natureza neste Juízo da 184ª. Zona
Eleitoral: autos no.s 216-21, autos no.s 243-04 e autos no.s 232-72,
todos descumpridos. Há notícias de que já ouve descumprimento em
outros Juízos, ensejando inclusive a decretação de prisão por
desobediência.
Assim, há que responder
a Reclamada Google pela pena cominatória fixada, de R$1.000.000,00
(hum milhão de reais), por dia, até que comprove nesta Justiça
Eleitoral o cumprimento da ordem aqui determinada, limitando-se ao
valor máximo de R$30.000.000,00 (trinta milhões de reais).
Será ainda, remetido
cópias ao Ministério Público Federal, para se apurar crime de
desobediência e comunicado à ANATEL, para providências
administrativas cabíveis quanto ao reiterado descumprimento de ordem
judicial e não submissão de empresa estrangeira à Lei e à ordem
nacional.
ISTO POSTO,
JULGO PROCEDENTE A
REPRESENTAÇÃO, confirmando a liminar deferida para determinar que a
Reclamada Empresa Google Brasil Internet Ltda promova a retirada de
veiculação, no prazo de 12 horas, contados da notificação, do
vídeo especificado no seguinte endereço: XXXXXXX
Bem como para que a mesma
preste informações sobre os dados cadastrais dos usuários
responsáveis pela inserção do referido vídeo e conta inscrita com
o nome de “FILHO DE UMA PUTA”, no seguinte endereço:
XXXXX
no prazo de 10 (dez)
dias, contados da notificação inicial.
A Google não cumpriu a
determinação judicial, tendo sido notificado da liminar em 14 de
setembro de 2012, com prazo de 12 horas, constando ainda o vídeo na
data da Ata Notarial, 18.09.2012, fls 84 razão pela qual aplico-lhe
a pena prevista no artigo 57-F, caput da Lei 9.504/97 e artigo 23 da
Resolução TSE 23.370, nos termos da fundamentação, em R$30.000,00
(trinta mil reais).
Aplico-lhe,
cumulativamente, na forma do artigo 461, § 3º. do CPC, a pena
cominatória no valor de R$1.000.000,00 (hum milhão de reais), por
dia de atraso no descumprimento da ordem judicial, contados do prazo
de 48 horas após a notificação da presente decisão, até que a
Reclamada Google, comprove nos autos a retirada dos vídeos
mencionados, limitando-se ao valor máximo de R$30.000.000,00 (trinta
milhões de reais).
Após o trânsito em
julgado, extraia-se cópia da inicial, das petições da Google e das
decisões proferidas por este Juízo, remetendo-se ao Ministério
Público Federal, para se apurar a responsabilidade por crime de
desobediência.
Após o trânsito em
julgado, remeta-se Ofício e Cópia à ANATEL, para providências
administrativas cabíveis contra a GOOGLE (Youtube), quanto ao
reiterado descumprimento de ordem judicial e não submissão de
empresa estrangeira à Lei e à ordem nacional.
Publique-se. Registre-se.
Intimem-se. Ciente ao Ministério Público.
Cascavel, 22 de setembro
de 2012.
VALMIR ZAIAS COSECHEN
Juíza Eleitoral
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